Recurso contra sentença que negou medidas cíveis contra envolvidos na morte de Manoel Fiel Filho


Recurso contra sentença que negou medidas cíveis contra envolvidos na morte de Manoel Fiel Filho

Arte: Comunicação MPF


Em 26 de fevereiro de 2024 o Ministério Público Federal (MPF) rebateu os argumentos que a Justiça Federal adotou para negar, entre outros pedidos, a declaração de responsabilidade de sete ex-agentes da ditadura por atos de violação a direitos humanos. A medida constituiria reconhecimento jurídico de que os réus atuaram para torturar e matar o metalúrgico Manoel Fiel Filho, em 1976, e ocultar as verdadeiras circunstâncias do crime. Em consequência, recairia sobre eles o dever de reparar os danos que a conduta causou à sociedade e as indenizações que o Estado brasileiro já pagou à família da vítima.

Ao apresentar recurso de apelação contra a decisão judicial, o MPF destacou que as ações estatais adotadas até o momento para dar publicidade aos fatos ocorridos na ditadura foram insuficientes para responsabilizar os réus pelas violações cometidas. Iniciativas como a instituição da Comissão Nacional da Verdade não viabilizaram reparações, por exemplo. O MPF frisou ainda que outros pedidos formulados na ação civil pública, também negados na decisão, não são passíveis de prescrição nem de anistia.

Além da declaração de responsabilidade e do ressarcimento aos cofres públicos dos R$ 438,7 mil que os familiares do operário receberam, as medidas requeridas contra os réus incluem o pagamento de indenização por danos morais coletivos, a cassação de aposentadorias e a perda de eventuais funções ou cargos públicos que ocupem. O MPF pede também que a União e o Estado de São Paulo sejam igualmente responsabilizados pela ocultação das causas da morte, declarados omissos por descumprir a obrigação de investigar o caso e condenados a divulgar os fatos relativos ao assassinato do operário.

O MPF pontua que a responsabilização de violadores de direitos humanos e o esclarecimento da verdade sobre os fatos são alguns dos deveres do Estado brasileiro decorrentes da Constituição e de compromissos internacionais assumidos pelo país. Providências como essas são indispensáveis para a prevenção de novos regimes autoritários e o combate à continuidade de atos de violência estatal.

Prescrição e anistia – O assassinato de Manoel Fiel Filho é imprescritível e impassível de anistia, inclusive na esfera cível, uma vez que foi cometido em um contexto de ataque sistemático e generalizado do Estado brasileiro contra a população, o que o caracteriza como crime contra a humanidade. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já reconheceu que não existe prescrição em demandas indenizatórias relacionadas a violações da ditadura. Ao mesmo tempo, a Constituição afasta prazos prescricionais para ações de ressarcimento ao patrimônio público, como é o caso dos pedidos do MPF.

A imprescritibilidade dos atos de violação a direitos humanos foi fixada também em duas condenações ao Brasil na Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH). O país aderiu voluntariamente à jurisdição do órgão e, portanto, é obrigado a cumprir suas sentenças. Segundo as decisões, o Estado brasileiro deve empreender as medidas necessárias para investigar e responsabilizar ex-agentes da ditadura envolvidos em casos como a morte de Manoel Fiel Filho. As determinações também proíbem o Judiciário de barrar processos com base na Lei da Anistia (Lei 6.683/79), que, segundo a corte, não possui efeitos jurídicos por constituir um instrumento de autoperdão a membros do aparato repressivo.

“As autoanistias são artifícios de impunidade, mediante os quais os perpetradores de violações aos direitos humanos se concedem imunidade penal pelos atos que cometeram. Ora, é evidente que ao próprio regime que pratica – ou praticava – a violação não cabe a iniciativa de se autoperdoar. Essa conduta atenta flagrantemente contra as premissas básicas do Estado de Direito republicano”, ressaltou a procuradora da República Ana Letícia Absy, autora do recurso do MPF.

Assassinato – Manoel Fiel Filho, que não tinha antecedentes criminais nem registros nos órgãos de repressão, foi detido em 16 de janeiro de 1976 por suspeita de ligação com o Partido Comunista Brasileiro (PCB). Levado para o Destacamento de Operações de Informações (DOI) do II Exército, na capital paulista, ele foi submetido a intensas sessões de tortura até o dia seguinte, quando sofreu estrangulamento e morreu. Laudos do Instituto Médico Legal (IML) de São Paulo buscaram ocultar as causas da morte atestando ausência de sinais de agressão, apesar dos hematomas, principalmente no rosto e nos pulsos da vítima.

A ação civil pública do MPF foi ajuizada contra dois ex-delegados da Polícia Civil de São Paulo (Edevarde José e Orlando Domingues Jerônymo), um ex-tenente da Polícia Militar paulista (Tamotu Nakao), dois ex-soldados da corporação (Alfredo Umeda e Antônio José Nocete) e dois ex-integrantes do IML (Ernesto Eleutério e José Antônio de Mello). Parte dos réus já faleceu.

 

O número da ação é 0005503-98.2009.4.03.6100

A tramitação pode ser acessada na consulta pública do site da Justiça Federal

Leia a íntegra do recurso de apelação do MPF

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